Não sei que horas são, mas sei que cedo não é, ou não ouviria o som que estou ouvindo, o mesmo que ouço nas madrugadas. Ontem, na hora em que fui me deitar, essa orquestra fazia esse som e o som lembra alguma coisa, tipo, uns vinte violinos tocando, baixinho, para não me acordar. Talvez não fossem violinos, mas flautas ou seriam crianças cantando embaixo da minha cama? Não, não são crianças, mas o que é, eu não sei. O que sei, na verdade, é que o som é bonito, suave, agradável de se ouvir, mas é triste. As religiosas garantem serem anjos rezando. Já os biólogos, negam, dizem serem formigas trabalhadeiras, daquelas que trabalham de dia, mas é na calada da noite que trabalham melhor — afirmam. — Não importa quem compôs essa música e muito menos a letra, que eu não entendo. O que sei é do sono que essa coisa me dá e por falar nisso preciso dormir. É tarde e eu tenho prova amanhã bem cedo e mesmo que eu me sinta preparada não quero abusar. Preciso gabaritar. Gabarito, ou não me chamo Jurema. Aliás, quem se chama Jurema que eu não conheço? Fica frio, vou gabaritar para ninguém errar o meu nome. (Jurema, que nome esquisito!) Então, tá. Tchau!!! Ah, não precisa me desejar boa sorte, não precisa. Estudei até agora para isso, não depender de ninguém. Fui!!!!
Fazia meses que o irmão da minha mãe havia morrido e da viúva nunca mais se teve notícias. Minha mãe estava preocupada já que se viam constantemente. Um dia mamãe me pediu que fosse a sua casa, saber como iam às coisas. E eu fui. Chamei uma amiga, mas como não pode, decidi ir sozinha. Toquei a campainha várias vezes e como ninguém respondeu, saltei o muro e, se precisasse, saltava até à janela, mas felizmente não precisou. Do ponto onde eu estava já dava para perceber que ela ia bem, quer dizer, estava ótima. Muito melhor do que mamãe, eu e todo mundo pudesse imaginar. Felizmente minha amiga não me acompanhou. Não teve o desprazer de ver o amigo do meu tio, um sujeito que a gente conhecia e respeitava, colocar na mão da mulher dele uma coisa que nem meu tio ou qualquer homem tivesse daquele tamanho. Quantas vezes vi o mesmo sujeito almoçando na casa deles, várias. Eu sei que titio morreu, mas a mulher não. Muito menos o amigo que, só perdeu o parceiro, menos o apetite. Há três meses meu tio come terra enquanto a mulher come outro tipo de comida dada pelo amigo. Eu não faço ideia de quanto tempo esses dois vêm se divertindo sem meu tio saber. E mamãe preocupada com a sem vergonha! Duvido que titio fizesse com ela o que o amigo está fazendo, duvido! Se tivesse me contado, eu não acreditava, mas ninguém me contou, eu vi! Acho que minha tia jamais saberá que estive na casa dela naquele dia. Não por eu ser boazinha porque, boazinha eu não sou. Para minha mãe falo qualquer coisa, pelo menos assim deixa de encher o meu saco. Pena que o amigo do meu tio não matasse a vagabunda com aquela coisa grandona. No princípio deve ter sofrido bastante, mas acabou se acostumando. Não aguento ver minha mamãe triste por causa dela.