NOSSOS HERÓIS.

 

   Pode ter pai igual ao meu, mas, melhor, não tem. Quando me levantei no dia que anunciaram as enchentes na grande Porto Alegre, ele tinha mochila nas costas, cantil na cintura e outras coisas cujos nomes não sei. Ele e outros três malucos. Os doidos combinaram de comprar tudo o que coubesse na caminhonete para levar para o sul. Agora, aqui estão eles, prontos para partir. O problema é deixar minha mãe chorosa, porém, orgulhosa, e a mim, com essa cara não sei de quê, como ficamos. Agora, que é lindo é, o seu familiar deixar sua cama, quentinha, para ajudar quem talvez vá dormir ao relento.

Dois dias depois papai nos montou a mensagem dizendo o seguinte: “Chegamos por terra para encontrar um mar de lama e destruição. Casas, lojas, escolas e prefeitura submersas, animais mortos nos telhados e na rede elétrica, ruas transformadas em rios de lodo. Esse foi o cenário que encontramos no município do vale do rio Taquari, no qual as chuvas torrenciais e a cheia do rio deixaram a trilha mais funda de mortes e destruição”. — dizia a mensagem. Mamãe chorava pelo povo do sul e eu por eles, meu pai e os amigos e por vir minha mãe do jeito que ficou. As pessoas dizem que, o que a mão esquerda faz, a mão direita não vê, mas, desculpem, não dá para segurar. Estou concentrada no que estou escrevendo, mas, entre vírgulas, verbos e adjetivos, rezo a Deus por eles, os vivos e os que não tiveram tal sorte, incluindo os animais que não deveriam passar pelo sofrimento que passam.

Força, Rio Grande! Força, voluntários! Ninguém merece um colo quentinho mais do que vocês. Vocês, heróis sem nome, sem cara e sem endereço. Parabéns!