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24 novembro 2023

FALA QUE EU ENTENDO.

 



Fiquei muito feliz quando minha avó veio nos visitar. Ela diz que eu me pareço com ela, o que me dá um orgulho muito grande, mesmo falando como falam as eruditas, mas tudo bem. Eu a amo assim mesmo. Minha mãe já sabia que vovó a deixaria falando sozinha quando eu chegasse e eu cheguei. Vovó me puxou pela mão até o meu quarto, sentou-se na cama ao meu lado e começou a falar. Não era conselho, porque conselho ela nunca me deu.  Vovó fala de um jeito, tipo assim, rebuscado, entende? Eu não falo, mas ela fala. Vovó me disse que só foi lá em casa para me contar o que ela costuma fazer quando está estressada. Disse vestir-se como quem vai caminhar. E o pior é que vai, disse ela. Que segue através dos rengues de eucaliptos onde milhares de flores, trepadeiras de todos os tipos e os canteiros de gerânios, canteiros de hibiscos amarelos e cor-de-rosa, e, ao lado de uma bananeira, há uma profusão de ásteres purpurinos ladeados por petúnias-brancas que a deixam novinha de novo. Vovó tentava relacionar a vida pacata de quem vive numa chácara com a vida agitada de nossa família aqui na cidade. Me deu uma vontade danada de dizer para ela que, "profusão de ásteres purpurinos ladeados por petúnias-brancas era o cacete. Ninguém entende essas coisas, vovó! Por que a senhora não caminhou por entre as árvores que existem por lá, entre as rosas, cujas pazes já deve ter feito com os cravos, com as margaridas e os copos de leite? Quem sabe não se sentiria melhor, caminhando entre os girassóis, as margaridas e as cristas de galo?" Eu não tenho coragem de repreender aquela que disse ter sido no passado o que eu sou hoje em dia e no futuro o que ela, pelo menos demonstra esconder de mim, é, mas não deixa que saibam. Não a repreenderia de forma nenhuma, não por ser minha avó, mas pela velhinha generosa e doce que é. Por isso, não falei nada, mas que tive vontade, eu tive. 
Amo minha avó. Aquela pessoa que sabe mais da vida do que a vida sabe dela.  

5 comentários:

J.P. Alexander disse...

Genial relato. te mando un beso.

Sérgio Santos disse...

Me emocionei lendo pq sinto mtas saudades dos meus avós. bjsss

Tomás B disse...

Es algo de que no disfrute de abuelos, la única que conocí fue la madre de mi padre pero era yo muy pequeño y tengo pocos recuerdos.

Saludos.

Graça Pires disse...

Uma avó cheia de sabedoria. Li o texto com muito interesse e sensibilizei-me.
Uma boa semana.
Um beijo.

Flávio Cruz disse...

Acho que entendo a sua vovó, Rô; para quem já passou de certa idade, é mais fácil caminhar pelo passado, no que pelo presente. :) Continue a escrever assim, menina! Meu abraço, boa semana.

ARREPENDIMENTO.